Polícia de Trânsito: Um dos empregos mais bem remunerados em Moçambique.


Briston Crontch

Às vezes dá vontade de parar de escrever e limitar-se em observar apenas. Mas é nesse simples acto de observação que também nasce e cresce a vontade de escrever, com objectivo de partilhar algum desconforto como este, que passarei a apresentar na tentativa de contribuir para o desenvolvimento de qualquer coisa, arriscando todas chances de não ser bem percebido, sem intenções catastróficas de ferir certas sensibilidade e de natureza pejorativa alguma, afectar a classe dos agentes da lei e ordem ou tentativa de manchar a imagem destes anjos da guarda. Que por sinal, não são todos com comportamentos desviados do ideal, abusivos e obsessivos ao dinheiro vindo de muito sacrifício.

É que as atrocidades são tantas que estravasam toda paciência de um ser consciente, até chego a pensar que a lucidez seja o pior veneno de todos estratos possíveis das substâncias tóxicas ao seres vivos, humano especificamente. Isso por que num transporte semi-colectivo, vulgo Chapa, de 15 lugares e estarem sobrepostos 30 passageiros entre magros e gordos, é um caso que já devia ter sido ultrapassado, ao benefício da passagem do Covid19.

Ao menos seria um argumento ainda válido de continuidade aos apelos da observância de lotação, além de que permite evitar ainda o contágio de outras doenças e a sua fácil e rápida proliferação, adicionar-se-ia como uma medida preventiva de minimizar a quantidade de vidas ceifadas em casos de haver um acidente, por excesso de velocidade, mau estado das estradas, etc.

Mas infelizmente a sobreposição dos passageiros, clientes nesse caso, os condutores, por vezes também proprietários das viaturas com pouco ou sem humanismo algum, alegam que precisam fazer receita para o pagamento de impostos aos agentes da polícia de trânsito. A indignação é sobre os casos por exemplo, em que o estado técnico e as condições da viatura são aceitáveis e a papelada toda está conforme. Não faz sentido ter que se sujeitar ao suborno. Melhor ainda quando até trás uma bagageira rebocável atrelada, diferente de outras situações em que no mesmo espaço ficam os passageiros e todo tipo de carga.

"Desculpe passageiros, preciso fazer dinheiro para pagar imposto à polícia". Além de que às vezes, a Polícia de Trânsito, em alguns postos estabelecidos ou não, já que dificilmente divulga-se ou tomar-se públicos o conhecimento de quais os postos são oficiais e quais são meramente "esquemas da corporação", mas estão lá outras especialidades da polícia que também se beneficiam dos tais subornos. Aí se levantam questões como: a Polícia já cobra algum imposto além de passar multas, em casos de violação? E qual é esse imposto que eu como cidadão não tomei conhecimento? Etc.

Possíveis causas.

A desinformação é um dos defeito de ser moçambicano. Pois também as vezes os nossos próprios canais oficiais de informação, são uma autêntica fonte de desinformação por excelência. Deve ter sido publicada alguma informação e me passou despercebido. Mas fora disso, já viemos vivendo essa fama de cobranças ilícitas ao longo da via pública sob argumentos de perder a carta ou mesmo a viatura e acabar preso por longos anos, já que a justiça não vela pelos pobres, que de certa forma pagam impostos directo ou indiretamente para a sobrevivência dessas instituições e elegem os seus opressores.

Podemos também admitir a hipótese da desonestidade e falta de integridade dos superiores dos agentes destacados às vias, ao darem instruções para acometerem-se a extorsão. Os baixos salários dos agentes e falta de profissionalismo que é extensivo em muitas instituições e aspirações à cultura corruptiva enraizada desde há muito que o medo de punições foi vencido, pois que o punidor provou do mel da ignorância e tornou irrelevante a observância das leis e estatutos ou qualquer ferramenta jurídica que rege pela conduta do sector.

Em causa ainda estariam as falsas promessas e propostas das melhorias das condições de vida, salários e outros benefícios dos agentes além de ser um consolo sobre a falta de valorização deste sector, que não é verdade. Pois a prepotência de alguns agentes paramilitares neste país e a defesa dos seus maus actos, mostra o contrário em relação aos militares por exemplo, que tem uma actuação limitada, restringida ao estar fardado e somente em missão de serviço, que na mesma, na via pública e ao volante passam humilhação com polícia de trânsito, numa disputa de superioridade fútil e inútil.

A ser desse jeito, com tantos postos de onde se encontram os agentes da polícia de trânsito e outras especialidades, sem contar com outras entidades fiscalizadoras como os das alfandegas, autoridade tributária, agricultura, INATRO, etc. fazer parte da corporação como polícia de trânsito compensa mais que qualquer outro tipo de emprego. Aliás, olhando apenas a diferença dos status de vários agentes na polícia, os da polícia de trânsito são os únicos que mais sabem usar o seu salário. Contam-se os polícias de trânsitos que não têm uma viatura se quer.

É um ramo invejável e pode ser o mais concorrido, se não o mais prestigiado e de elite. Quanto aos requisitos, retira-se aptidão e aspectos de postura na candidatura. Os preços em termo de valores para ter a vaga, os custos são exorbitantes e superam dois anos de um programa de mestrado ou doutoramento em qualquer universidade pública ou privada. Em compensação com outros agentes da lei e ordem em termos de produtividade, fora da situação de esquemas criminais como a Sernic e a Guarda Fronteira, a polícia de trânsito é intocável.

Para esta classe de agentes, os condutores dos semi-colectivos interurbanos têm como tarefas, fazer a receitas para despesas da viatura: abastecimento, reparação e manutenção; receita para ter retorno do investimento; receita para seu vencimento e sobrevivência; e, acima de tudo está ou existe a imprescindível e indispensável receita para os agentes da lei e ordem. O imposto. Isso é sempre que tender se fazer à praça ou na via pública em mais uma jornada, durante ou mesmo depois da tal jornada.

Extensão da prática

Infelizmente, mesmo os agentes de trânsito da polícia municipal nas suas operações, também têm seus vencimentos melhorados sobre esse ramo de negócio - transportes semi-colectivos e camiões. Aliás, leva vantagens quem é polícia de trânsito e investe no ramo dos transportes, as ameaças e perdas são reduzidas. Tem poucas taxas, possivelmente, a pagar em prol de pôr sua viatura a operar nas vias públicas deste belo país.

Porém, não é só nesse aspecto em que as coisas estão tão mal. As cobranças são feitas por outros agentes de forma camuflada como oportunistas em várias situações. Como as de anulação das multas e recuperação das cartas não por via legalmente aprovadas. Às vezes parace haver um esquema entre os serviços de emissão das cartas e o sector da polícia de trânsito.

À quem recai a culpa? 

Existe deste lado uma espécie chamada sociedade, onde todas actividades são realizadas e outros fenómenos humanos se fazem sentir. A sociedade ou comunidade moçambicana é tolerante a todo e qualquer tipo de maldade excepto a feitiçaria. Mas pode perdoar e deixa estar maus dirigentes e agentes ou autoridades com condutas duvidosas, fora dos padrões definidos e condutas de ética sobre a sua actuação, caso haja alguma e disponível.

É o povo que é cúmplice, antes dos motoristas serem culpados, e pouco saberem sobre as circunstâncias que podem determinar a se passar uma multa. Claro que custa denunciar sempre que, mal que o condutor mostra o livrete do carro está lá alguma nota, um valor escondido e o acto aconteceu. Os envelopes, as pastas e outros tipos de dispositivos que albergam os documentos necessários ao exercício da actividade, está lá entalada alguma quantia monetária. Isso não é segredo, a maioria atenta que já foi utente dos Chapas sabe disso, já viu. Na rádio e televisão só passam casos de tentativas ou flagrantes de corrupção de poucos casos e situações.

Que das quais passo a citar: nos casos em que o valor é inferior à vontade dos agentes, quando a entrega do valor é efectuada acidentalmente na vista do público ou se haver suspeitas de exposição ou uma tentativa de provar que aceitam qualquer suborno, em casos em que o valor não dá para dividir toda a equipe naquele posto, etc. Mesmo depois do Comandante geral, diga-se o humilde e Incansável defensor e educador cívico destes, ter desencadeado campanhas de combate contra todas e qualquer tipo de tentativa de cobranças ilícitas, vítimas de suborno e extorsão nas vias públicas.

Em última instância, podíamos ainda apontar o dedo às escolas de condução e outros recursos que permitem a emissão de cartas por vias ilegais. A aquisição de carta pelo facto de apenas saber operar a viatura ignorando o conhecimento das regras de trânsito, a função de cada agente nos postos de controlo e de regulação de trânsito ou de segurança, pode estar por detrás também, do fenómeno. Há situações em que suborna-se por desconhecer os seus direitos, deveres e obrigações como condutor ou operador dos transportes.

Opinião Pessoal

Pelos meus cálculos, com base nas observações, é um mal entendido e consentido pelo público moçambicano em geral e à todos níveis de poder neste país. Desde os políticos e dirigentes até ao último moçambicano que nada vê a vantagem da existência de um Estado e um governo a gerir este país. Então, a conclusão é que um dos empregos bem remunerados pode não estar no facto de fazer parte das FDS, mas sim, ser polícia de trânsito compensa que ser qualquer outra coisa no aparelho do Estado.

Apesar de haver rumores de perseguição dentro da corporação, isso é normal, em qualquer sítio há esse fenómeno e os casos de polícias de trânsitos lesados pelo povo pela má conduta e má actuação ou excessos são raros, bem como são escassos os casos de denúncias e vingança contra a sua má actuação na via pública.

A surdez propositada, a cegueira colectiva e conformidade induzida do povo, pela intimidação e medo da represália de se pronunciar contra o mal e denunciar incompetência e inconformidades é normal para os moçambicanos e a vida segue o seu curso, como as leis da natureza mandam. Só não podem nunca, serem seguidas as leis feitas por quem as não as cumpre. Até então, somos todos cúmplices pela má actuação das autoridades. Só que ser polícia de trânsito em Moçambique é melhor que qualquer outro emprego ou serviço público: há receita diária garantida, com base nos moldes de actuação "normal" aqui descritos e de outras formas.

Agente de Polícia de Portugal invade uma residência em cobrança de carta de condução. Fonte: Whatsapp Video Post. 

Há um caso em que um agente da polícia de trânsito até invade uma residência em cobrança de carta. É complicado perceber como se chegou ao tal nível. Que é arriscado ser polícia de trânsito é quase impensável, mas que eles fazem dinheiro nas vias públicas, é evidente e indiscutível. 

A melhor parte até é ser difícil ver a Polícia de Trânsito envolvida e em apuros, em confrontos nas situações como as de intervenção contra as manifestações populares de várias formas. Agem tranquilos, serenos, motivados a facturarem à vontade, sem medo nem hesitação no exercício das suas funções, em detrimento de estarem a sensibilizar e aconselhar aos condutores a optarem numa condução defensiva, responsável e prudente para poupar mais vidas e evitar acidentes que também destroem infraestruturas. 

Salve-se o povo, que acolhe os mesmos e assim os educa, aceita e os trata com respeito, sem mágoas nem rancor. Salvem-se os condutores que não lêem sobre código de estrada, as multas e infracções, etc. Bem haja o Polícia de Trânsito que tenta ser exemplar ainda que lhe custe a carreira e a condenação de continuar pobre mas honesto. Também gostaria de ser PT para fazer diferente do que se reclama, pois que não é o SISTEMA, É UMA QUESTÃO DE CARÁCTER E COMPORTAMENTO.

Bilene, 26 de Abril de 2023

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