EM VEZ DE ACEITAR O QUE RESTA, A MULHER DECIDE CRIAR O PARCEIRO IDEAL DO ZERO.
Adãos Impossíveis: Como Tradições Africanas Roubam a Juventude e os Sonhos das Mulheres
Acabava de ler um trecho sobre violência doméstica, numa das plataformas nas redes sociais, uma seguida da outra e a primeira tratavasse de uma pessoa famosa e quanto a segunda não. Tanto que me desliguei de tudo e pus-me a pensar sobre outros aspectos inerentes ao caso, quando me deparei com essa reflexão - E se actualmente, toda mulher decepcionada até ao extremo podesse construir o seu próprio Adão. Achei sugestiva. Embora pudesse processar sobre os escândalos de Moçambique.
A frase “Since y’all are marrying the good men and leaving the rest for us, I’ve decided to mould my own Adam by myself 😂” carrega um tom humorístico e irónico, mas revela camadas profundas de frustração e empoderamento feminino.
No fundo, ela critica a escassez percebida de “bons homens” no mercado matrimonial, sugerindo que as mulheres “boas” ou sortudas monopolizam as opções ideais, deixando as demais com parceiros inadequados. Dentre eles os desajeitados, fracassados, ricos mas rabugentos, vaidosos mas violentos, bonitos mas desonestos, traidores e entre outros perfis insanos para grandes mulheres.
A referência a “mould my own Adam” (moldar o meu próprio Adão) evoca a narrativa bíblica da criação — quando Deus molda Adão do barro — simbolizando uma rebelião criativa: em vez de aceitar o que resta, a mulher decide criar o parceiro ideal do zero. Ao seu gosto, com comportamentos e atitudes por ela desenhados.
Esse gesto reflecte o desejo de autonomia num mundo onde as escolhas românticas são limitadas por pressões sociais, económicas e culturais. O emoji de riso ameniza o tom, mas não esconde o subtexto de desilusão com as dinâmicas de género, onde as mulheres frequentemente se sentem compelidas a contentar-se com menos do que merecem.
Essa ironia ressoa especialmente em contextos onde há pressão para casar cedo, transformando o humor num comentário sutil sobre empoderamento e resistência. Ou ainda, pressão para não se envolver com um que não tome conta do recado da vontade dos familiares, amigas e outros intervenientes que exercem influência sobre a mulher na comunidade e sociedade onde está inserida.
Frustrações Matrimoniais das Mulheres Africanas entre Dilemas e Tradições
Em muitos contextos africanos, a frustração expressa na frase ou no preciso pensamento expresso originalmente a inglês, é da nigeriana Ozioma Chioke, porém não é apenas uma piada leve sobre a falta de “bons homens”, mas um eco de uma realidade sombria, onde as mulheres são sistematicamente privadas de autonomia sobre suas vidas românticas e matrimoniais.
Enquanto a frase sugere uma solução individual — “moldar o próprio parceiro” — a realidade africana é marcada por tradições patriarcais que impõem casamentos sem consentimento, perpetuando ciclos de desigualdade, pobreza e violência. Tal, talvez igual à alguns cenários de outros quadrantes como se pode ver na Ásia também.
Essa frustração não nasce apenas da falta de “homens ideais”, mas de um sistema que força mulheres a se unirem a parceiros que não desejam, muitas vezes escolhidos pelos familiares para preservar a honra, alianças económicas ou costumes ancestrais.
Casamentos Forçados e Infantis: A Dor Disfarçada de Cultura
Um dos maiores dilemas é o casamento forçado e infantil, que afecta milhões de meninas africanas. Relatórios internacionais mostram que o casamento precoce é impulsionado por pobreza e normas culturais que tratam as meninas como bens de troca, usados para aliviar encargos familiares ou preservar a “honra”.
Na África Subsaariana, muitas são prometidas ainda crianças, perdendo os anos de descoberta, educação e autodesenvolvimento. São submetidas a tarefas domésticas exaustivas, casadas com homens muito mais velhos e privadas da infância e da liberdade.
O impacto é devastador, como podemos conferir alguns exemplos:
- Riscos de saúde como infecções sexualmente transmissíveis, complicações no parto e morte materna;
- Traumas psicológicos e isolamento social;
- Reprodução da pobreza de geração em geração.
Na África do Sul, o que pode parecer nojento para uns, a tradição chamada ukuthwala — o sequestro de meninas para casá-las à força —, embora ilegal, ainda persiste em comunidades rurais, sendo defendida por alguns como “prática cultural”.
O Peso das Expectativas e o Silêncio das Vítimas
Ainda nesta era, assim testemunhamos essas tradições, que não apenas frustram aspirações pessoais, mas colocam as mulheres em dilemas morais e emocionais profundos.
Muitas são obrigadas a casar com homens que não partilham dos seus valores ou sonhos, sem consulta ou consentimento. Os familiares, motivados por pressões económicas, aceitam propostas em nome delas, priorizando alianças tribais ou financeiras sobre o bem-estar individual.
Em países como a Zâmbia, relatos de meninas forçadas a casar com estranhos evidenciam o trauma psicológico e a violência sexual presentes nesses arranjos. Se nada for feito, o número de casamentos infantis em África poderá duplicar até 2050, tornando o continente a região com maior incidência global.
O que mais incomoda aos pensadores 'sensacionais' do modernamente político, não são até essas imposições expostas as mulheres na tenra idade, mas sim, a privação dos direitos básicos enquanto ainda elas são menores e deviam explorar os momentos de infância, como tantas outras crianças que chegam a descobrir e desenvolver habilidades e capacidades para a vida.
Entre o “Adão Ideal” e a Mulher Moldada pelo Sistema
A autonomia sonhada pela mulher que “decide moldar o seu Adão” contrasta brutalmente com a realidade de milhões de africanas que são moldadas por imposições sociais. Muitas perdem oportunidades educacionais e profissionais por casamentos precoces, para pura e simplesmente alimentar e satisfazer as vontades e vaidades dos seus familiares.
Organizações como a Human Rights Watch e a UNICEF alertam que o casamento infantil viola direitos humanos básicos e nega às meninas o direito à infância, educação e liberdade de escolha.
Em contextos de conflito, o casamento precoce é usado como “protecção”, mas na verdade aumenta a vulnerabilidade e a dependência. Estudos mostram que as jovens vítimas citam pressão familiar, medo e falta de alternativas como principais razões para aceitarem tais uniões.
Houveram situações, por exemplo, de soldados e outros funcionários nos locais de conflitos armados, que levaram meninas órfãs para cuidar e ocasionalmente se casaram com as mesmas, em alguns casos. Complicando o senso do julgamento do que propusemos ao debate.
Sinais de Resistência e Caminhos de Esperança
Apesar do cenário sombrio, sinais de mudança emergem. Activistas, líderes comunitários e organizações civis lutam para reformar leis e costumes, promovendo o empoderamento feminino e o consentimento livre como pilares da nova geração africana.
Mas enquanto as tradições nocivas persistirem sem intervenção, a frustração das mulheres não será apenas sobre encontrar o “homem ideal” — será sobre reconquistar o direito de escolher e sonhar.
✍️ Autor: Paulino Intepo
📅 Publicado em: Outubro de 2025
🏷️ #África #CasamentoInfantil #EmpoderamentoFeminino #TradiçãoVsDireitos #CulturaAfricana #Mulheres


Comentários
Enviar um comentário