FALHA O BOICOTE DO G20 - 'NOVA' ORDEM MUNDIAL SE FIRMA EM JOANESBURGO
A pérola do Índico possui uma das costas mais extensas e ricas de África: 2.700 quilómetros de litoral e uma Zona Económica Exclusiva de mais de 570 mil quilómetros quadrados. Deveria ser uma bênção. Em vez disso, tornou-se uma maldição. Todos os anos, perdemos entre 60 e 70 milhões de dólares – mais de 4 mil milhões de meticais – em pesca ilegal, não declarada e não regulamentada.
Esse dinheiro daria para construir dezenas de escolas, hospitais ou estradas nas províncias costeiras. Em vez disso, vai para os bolsos de frotas estrangeiras, principalmente chinesas, que arrastam tudo o que mexe, destroem os recifes de coral, extinguem espécies inteiras e deixam os nossos pescadores artesanais sem nada para levar para casa.
“A pesca ilegal não para na beira da água. Cada captura ilegal cria ondas que perturbam famílias, economias e a luta por oceanos sustentáveis”, escreveu recentemente a página Ascending Africa no X. Tem toda a razão. Mas em Moçambique essas ondas já viraram tsunamis que afogam o nosso povo.
As principais culpadas são frotas distantes chinesas, mas também europeias (espanholas e outras) e asiáticas que operam sem licença ou com licenças falsas. Muitas “bandeiram-se” em países africanos pobres para disfarçar a propriedade chinesa e fugir à fiscalização. Usam redes de arrasto proibidas, pescam em zonas reservadas à pesca artesanal, capturam tubarões apenas pelas barbatanas e destroem corais com explosivos ou venenos. Relatórios da Environmental Justice Foundation mostram que, entre 2017 e 2023, navios chineses estiveram envolvidos em dezenas de casos de ilegalidades nas nossas águas. Pescadores moçambicanos contam que veem essas embarcações gigantes apagarem os sistemas de identificação (AIS) para se tornarem invisíveis – verdadeiros navios fantasmas que saqueiam impunemente.
Em 2013-2014, o governo de então prometeu proteger este mar. Criou a Ematum (Empresa Moçambicana de Atum), a ProIndicus e a MAM com empréstimos secretos de mais de 2 mil milhões de dólares, alegadamente para comprar barcos de patrulha e desenvolver a pesca nacional. O resultado? Um escândalo mundial conhecido como “dívidas ocultas”. Os barcos nunca patrulharam coisa nenhuma. Muitos nem sequer existem ou estão apodrecendo nos portos. O dinheiro desapareceu em subornos, comissões e contas offshore. Moçambique ficou com uma dívida monstruosa que ainda hoje pagamos com cortes na saúde e educação. O mar continuou – e continua – sem defesa.
O saque não se limita ao oceano. No Lago Niassa, partilhado com Malawi e Tanzânia, a pesca predatória ameaça espécies endémicas únicas no mundo. No Lago Cahora Bassa ou na Albufeira, a capenta – o “ouro branco” de Tete – é capturada ilegalmente com redes mosquiteiras, venenos e explosivos. Operadores ilegais subornam fiscais e as autoridades locais e levam toneladas de peixe imaturo.
Em 2025, produtores legais queixam-se de concorrência desleal e da fraca fiscalização. A albufeira, que deveria alimentar milhares de famílias, está a ser esvaziada por redes criminosas vinda do Malawi, Zâmbia, Zimbábue e até África do Sul. Onde está a Marinha de Guerra de Moçambique nesse caso? Sem meios e no meio de fiscais corruptos.
Os poucos fiscais que existem ganham salários de miséria. Um suborno de 5 mil meticais basta para um barco ilegal descarregar tranquilamente. A Marinha tem poucos navios operacionais e mesmo assim as matérias de patrulhamento são de pouco domínio dos militares face à dezenas de instituições criadas que tornam o processo de fiscalização monótono e oneroso com os escassos recursos existentes.
O centro regional de monitorização da SADC, sediado em Maputo, é uma esperança, mas ainda engatinha. Mesmo o Centro de Operações de Fiscalização Maritima já criado, ainda parece burocrático que privilegia mais operações dos pescadores ilegais triunfarem. Projectos com financiamento norueguês ou da FAO prometem melhorar o controlo, mas enquanto isso as frotas estrangeiras continuam a rir-se de nós.
- Milhares de postos de trabalho para pescadores artesanais;
- Proteína barata para as famílias mais pobres (90% do peixe consumido vem da pesca artesanal);
- Receitas fiscais que poderiam financiar escolas e hospitais;
- Biodiversidade única: tartarugas, tubarões, corais e espécies que só existem aqui;
- O futuro dos nossos filhos, que crescerão num país onde o mar já não dá peixe.
Moçambique não precisa de mais promessas nem de mais centros bonitos em Maputo. Precisa de:
1. Declarar a pesca ilegal crime transnacional organizado, com penas pesadas e confisco imediato de barcos;
2. Equipar a Marinha com navios, drones e radares – e pagar salários dignos aos fiscais para acabar com o suborno;
3. Proibir o “bandeiramento” de conveniência que esconde donos chineses ou europeus;
4. Criar cooperativas fortes de pescadores artesanais com acesso a crédito e mercados;
5. Exigir transparência total nas licenças de pesca e publicar online quem pesca o quê e onde.
O mar é nosso. O peixe é nosso. O futuro é nosso. Se continuarmos de braços cruzados, daqui a dez anos os nossos filhos só conhecerão o camarão e o atum nas latas importadas da Ásia ou da Europa – pagando o triplo do preço.
Basta! O povo moçambicano tem direito a saber quem rouba o seu mar e quem, dentro do próprio país, fecha os olhos em troca de envelopes. A luta por oceanos sustentáveis começa em casa – começa agora.
Porque, como bem disse o post que nos despertou a consciência: cada captura ilegal não é só um peixe a menos. É uma família com fome, uma criança sem escola e um país mais pobre. Chega de ondas. Está na hora de virar a maré.
Sinceramente precisamos mudar de mentalidade
ResponderEliminarTanta semelhança entre Portugal Brasíl e Moçambique ? Leis bonitas que servem a classe dominante mas o povo fica a ver navios
EliminarAyé? Mas para o caso de Moçambique, só as leis não são sujeitas a classe dominante
EliminarUrgentemente...
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