AS CASAS DE COLMO: UM SÍMBOLO DE HERANÇA CULTURAL E SUSTENTABILIDADE EM ÁFRICA
A recente construção da “Arca Moderna” pelo profeta ganês Ebo Noah — duas embarcações gigantes, cada uma alegadamente capaz de acolher cinco mil pessoas — reacende um velho dilema humano: por que continuamos a acreditar tão profundamente em mensagens que desafiam a ciência, a evidência e a própria realidade empírica?
Durante 11 meses, Noah dedicou-se ao projecto que, segundo afirma, lhe foi ordenado por Deus para proteger o seu povo do “fim muito próximo”. Muitos riem, tal como — lembra ele — riram de Noé na narrativa bíblica. Outros acreditam com devoção. Outros ainda observam com espanto, conscientes de que este fenómeno não é apenas religioso, mas psicológico, sociológico e universal.
A psicologia social sempre estudou o impacto das crenças na percepção da realidade. William James, um dos pais da psicologia moderna, dizia que a fé pode produzir “factos interiores” tão fortes que se tornam mais reais do que o mundo exterior.
Da mesma forma, Leon Festinger, ao estudar seitas apocalípticas, concluiu que quando a crença é ameaçada por factos, os crentes podem até reforçar a sua convicção — um fenómeno conhecido como dissonância cognitiva.
O caso de Ebo Noah encaixa-se nesta linha: a fé opera como uma lente, não como um espelho da realidade. Ela molda o que vemos, o que tememos e aquilo em que confiamos.
Crise económica, frustração social, ausência de Estado e vulnerabilidade emocional são ingredientes que historicamente amplificam a busca por explicações sobrenaturais.
Em contextos de incerteza, a fé torna-se não apenas um acto espiritual, mas um engenho de sobrevivência psíquica.
É por isso que projectos como a “Arca Moderna” não devem ser vistos apenas como irracionalidade, mas como sintomas de sociedades onde a esperança é escassa e a autoridade da ciência é frágil.
A neurociência moderna não descarta a fé; pelo contrário, mostra como ela acende áreas cerebrais responsáveis por recompensa, pertença e calma emocional.
As pessoas não aderem a estas visões por ignorância, mas porque procuram sentido — e sentido é algo que nem a ciência, nem a política, nem a economia têm conseguido oferecer plenamente.
Nas redes sociais, o caso tornou-se meme:
“Que ele ponha tomadas na Arca… o homem precisa de carregar o telefone.”
Mas por detrás da piada está uma verdade amarga:
a nossa sociedade está perdida entre dois mundos — a tecnologia que promete tudo e a fé que ainda explica tudo o que a tecnologia não resolve.
A Arca de Ebo Noah pode ser uma obra de fé, loucura, engenharia ou desespero. Mas é sobretudo um espelho: mostra-nos a eterna necessidade humana de acreditar quando a realidade se torna demasiado pesada.
Comentários
Enviar um comentário