A DITADURA DA BELEZA
Como o Mundo Obriga a Mulher a Pagar Para Ser Vista
Vista a partir de Bluntyre, Malawi, esta pode não ser uma reflexão nova — talvez seja das mais antigas —, mas continua a ser uma oportunidade urgente para recordar os sacrifícios que o mundo material impõe à mulher para que ela se destaque aos olhos da maioria. Num tempo em que até políticos desvalorizam abertamente os diplomas e a educação formal, proclamando que já não são critérios fiáveis para o mercado de emprego, a mulher é empurrada pelo eco vazio do mundo a acreditar que pode substituir as suas qualificações humanas, intelectuais e espirituais pela simples estética do seu corpo.
Entre os homens, um dos critérios mais usados para escolher uma parceira continua a ser a beleza — ou, no mínimo, a boa aparência. São poucos os que olham para o coração, para o carácter ou para a profundidade espiritual de uma mulher. Se não for pela riqueza dela ou dos seus familiares, os homens vão pelo caminho mais ilusório e ao desejo da carne, mesmo. Seja para casar, namorar, amantizar ou apenas satisfazer necessidades fisiológicas, a beleza tornou-se uma espécie de moeda social que define o valor de muitas mulheres antes mesmo de abrirem a boca.
A sociedade moldou homens e mulheres para acreditarem que o que importa são as qualidades físicas, aquilo que os olhos aprovam à primeira vista. E, com o advento das redes sociais, esta lógica ganhou um palco global. Mulheres que noutros tempos seriam julgadas como prostitutas agora reaparecem embaladas por rótulos como “empoderadas”, “batalhadoras”, “independentes” ou “influenciadoras”. E assim se normaliza a ideia de que a aparência basta — não importa se existem competências, ética ou profissionalismo.
No mercado de trabalho, a lógica repete-se: para atrair clientes, utentes ou parceiros, a aparência é tratada como factor decisivo. Basta que uma mulher seja bela para resolver metade dos problemas da instituição que a expõe. Consequentemente, ridiculariza-se, invisibiliza-se e desvaloriza-se todas as outras que não possuem atributos considerados “aceitáveis” aos olhos da sociedade, mesmo que disponham das melhores competências.
Com a evolução da medicina estética, rios de dinheiro e tempo são consumidos em procedimentos destinados a produzir o corpo idealizado pelo olhar colectivo. As dores, os riscos e os efeitos negativos são romanticamente apresentados como “sacrifícios válidos”, quase um ritual obrigatório para alcançar a beleza legitimada pelo mundo.
Nas praças, ginásios e passeios ou passadeiras, mulheres moldam os seus corpos em horários diversos, sozinhas ou em grupo, com personal trainer e outros amadores no sector das actividades físicas com enfoque a moldagem dos músculos. E à medida que perseguem a forma perfeita, algumas relações vão-se destruindo, enquanto outras surgem baseadas nos mesmos objectivos superficiais.
Contudo, a verdade permanece simples: pares perfeitos, relacionamentos duradouros e amores até à morte não nascem de catálogos onde a beleza é requisito absoluto. As pessoas apaixonam-se porque se reconhecem, porque se entendem e porque se aceitam — não porque correspondem aos padrões de um mundo ansioso por aparências.
Mas até que essa consciência se torne regra — e não excepção —, continuaremos a viver num sistema onde a beleza é mercadoria, onde serviços estéticos movimentam economias inteiras, e onde homens e mulheres se esforçam para adquirir qualidades exteriores para “enganar”, aliás, para engajar parceiros que satisfaçam o ego humano.
Os homens, por sua vez, são empurrados para provar atractividade através do rendimento financeiro, do desempenho sexual, do estatuto e da posse de bens, criando uma outra lista de exigências igualmente artificiais.
Este é o mundo. E ainda que existam excepções, a regra continua a ser esta: a aparência vale mais que o ser — e a beleza custa caro, sobretudo às mulheres.

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