Erosão Silenciosa do Sistema de Saúde Pública em Moçambique

Afinal o que tem tido nas bolsas, lancheiras e sacas de alguns quadros quando entram vazios e saem cheios nas primeiras horas em alguns sectores, que trás muita felicidade na saída e com muita flexibilidade? 

O movimento de alguns funcionários da saúde nas primeiras horas do dia levanta suspeitas! 

Para quem é eventualmente assíduo na observação do ambiente ao seu redor, para os que andam sempre em alerta e com mente atenta por onde se encontram, e que involuntariamente ficam a par da conjuntura social, política e até económica do país, é inevitável fazer levantamentos inoportunos de vários assuntos que importam para a sociedade moçambicana.

É difícil não criticar e ao mesmo tempo admirar a diversidade de tudo que envolve o povo moçambicano. Dentre as negatividades lamentáveis estão os casos recorrentes de comportamentos de roubalheira que envolvem funcionários públicos. Isso pode ser observado nos movimentos de alguns profissionais da saúde nas primeiras horas após a abertura dos centros e hospitais públicos.

Em quase todos os sectores, surgem desconfianças. Há locais, por exemplo, onde se veem funcionários entrando com bolsas e lancheiras vazias, seja no depósito ou nos sectores para onde cada manhã são distribuídos produtos, materiais e medicamentos, que depois fazem encher essas mesmas bolsas e lancheiras. Os protagonistas saem saudando os demais funcionários, sorrindo, mantendo o papo em dia, como se fosse um cenário habitual.

O mais incrível é que, às vezes, são essas mesmas pessoas que podem ser vistas nas bancas e varandas onde se vendem medicamentos, sem mencionar que eventualmente podem ser avistadas em clínicas, farmácias ou consultórios médicos privados e clandestinos.

Consequentemente, após atender duas ou três pessoas sorteadas nesses primeiros períodos, o resto dos utentes são remarcados para os dias seguintes, sob a alegação de que faltam materiais ou medicamentos. Quando não, ainda podem ser direcionados, com uma espécie de receio, a uma clínica ou farmácia específica, como se houvesse um código ou cupão de desconto, seguindo as indicações do funcionário que os atendeu no estabelecimento público.

É dolorosamente evidente que isso já foi normalizado e todos parecem estar de acordo, ainda que sem acordos lavrados oficialmente. Esta não é uma denúncia, mas apenas uma lamentação, olhando para aqueles cujo poder financeiro não lhes permite ter acesso às recomendações que outros pacientes têm recebido.


Então, o que se deve fazer para combater esses casos se o povo em geral não foi ensinado a ser vigilante, a tomar conta do que é do Estado e a denunciar irregularidades aparentemente sutis como estas? 

Com a evolução do mundo e o aprimoramento do maneio dos processos judiciários, devido à sua complexidade e especialidade, parece não haver margem para que um cidadão comum consiga ter espaço para, mesmo após flagrar uma irregularidade, seguir com a denúncia, a repreensão, o repúdio ou a queixa.

Como consequência, tudo fica em torno dos especialistas que, na devida altura dos actos e factos, não estão presentes, e cujos escritórios a população nem sabe para que servem. Isso significa que, para denunciar alguma irregularidade, deve-se, ultimamente, recorrer apenas aos programas de TV e não aos quadros do Aparelho de Estado designados e pagos pelo erário público para os devidos efeitos.


Esses mesmos funcionários trancam os escritórios por fora, ligam a TV ou abrem os grupos das redes sociais para ver o que lhes pode aparecer como oportunidade de trabalho ou como fonte de mais algum rendimento, caso algo chegue a se publicar nos fóruns das redes sociais. Afinal, esse mecanismo não seria para auxiliar o trabalho no terreno, com dados colhidos no atendimento ao público?


Em suma, isso acontece na saúde, assinam-se apenas livros de presença em outras instituições, e o país segue ao sabor do vento. Ninguém produz, todos esperamos as doações e delas preenchemos as bolsas e lancheiras, abastecendo e aplicando onde só nós sabemos: os básicos constroem nas suas comunidades dentro do país e os superiores construem ou compram apartamentos no estrangeiro. E onde era suposto e preconizado fica prematuramente vazio, serviços parados, já que não "dá lucro algum". Termina o mês, chega a recompensa e Moçambique "avança".


Passam-se anos, mudam-se as pessoas nos sectores, mas os comportamentos e as práticas permanecem iguais ou pioram. Não há sangue novo nem os cansados, todos comungam das mesmas acções e "é assim mesmo": na justiça, na defesa e segurança, na saúde, na educação, etc. Até quando? 

Finalmente, essa semama não sabemos se celebramos pela vitória da nossa seleção de Tang Soo do ou da vitória da Espanha no Euro. Já que o nosso patriotismo e Pan-Africanismo ou africanicidade é das redes sociais apenas!



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