LEÕES DE ROMA E NÃO D'ÁFRICA COMO SE ESPERAVA

Os Papas Leão e o Peso Histórico de um Nome

Sai a fumaça branca no Vaticano e, mais uma vez, o mundo assiste à proclamação de um novo Papa. Em 2025, a Igreja Católica acolhe Leão XIV. Muitos se interrogam: terá sido apenas uma decisão espiritual ou também influenciada por interesses geopolíticos? Com a sombra de figuras como Donald Trump a pairar nos corredores da política mundial e eclesiástica, a especulação floresce. 

Contudo, mais notório ainda é o facto de que, uma vez mais, não se tratou de um Papa africano — e muito menos negro. Apesar dos apelos à diversidade e inclusão, a Cúria Romana permanece hesitante em romper com a tradição eurocêntrica.

O nome escolhido, Leão, traz consigo um legado de força, autoridade e reforma. Abaixo, traça-se uma linha histórica dos catorze papas que adoptaram esse nome, desde o século V até ao presente.

1. Leão I, o Magno (440–461)

Nome de baptismo: Leão (nome completo desconhecido). 

Origem: Provavelmente Toscana, Itália. 

Notas de Contexto: Enfrentou a queda do Império Romano do Ocidente. Distinguiu-se ao convencer Átila, o Huno, a poupar Roma.

Contribuições:

• Defensor da ortodoxia cristã no Concílio de Calcedónia (451);
• Fortaleceu a primazia do bispo de Roma. 

Legado: Primeiro papa chamado “Magno”; canonizado e Doutor da Igreja.

2. Leão II (682–683)

Origem: Sicília. 

Contribuições: Reforçou a ortodoxia contra heresias; promoveu o canto gregoriano

Legado: Canonizado, breve pontificado.

3. Leão III (795–816)

Origem: Roma. 

Notas de Contexto: Coroou Carlos Magno, fundando o Sacro Império Romano-Germânico.

Legado: Defensor da aliança entre Igreja e Estado; canonizado.

4. Leão IV (847–855)

Origem: Roma. 

Contribuições: Construiu a Muralha Leonina para defender Roma dos sarracenos.

Legado: Figura de resistência e urbanismo defensivo; canonizado.

5. Leão V (903)

Origem: Ardea, Itália. 

Notas de Contexto: Governou em tempo de anarquia papal (Saeculum Obscurum).

Legado: Pontificado de curta duração, interrompido por um antipapa.

6. Leão VI (928)

Origem: Roma. 

Notas de Contexto: Totalmente controlado pela aristocracia romana.

Legado: Figura obscura sem canonização.

7. Leão VII (936–939)

Origem: Roma. 

Contribuições: Estimulou a reforma monástica, em especial através da Ordem de Cluny.

8. Leão VIII (963–965)

Origem: Roma. 

Notas de Contexto: Papa nomeado pelo imperador Otão I, em conflito com Bento V.

Legado: Sua legitimidade foi contestada.

9. Leão IX (1049–1054)

Nome de baptismo: Bruno de Egisheim-Dagsburg. 

Origem: Alsácia (atual França). 

Contribuições:

• Lutou contra a simonia e os abusos clericais;
• Envolvido no Cisma do Oriente, que dividiu a Igreja Católica da Ortodoxa;

Legado: Canonizado; figura activa de reforma, mas controversa.

10. Leão X (1513–1521)

Nome de baptismo: Giovanni di Lorenzo de’ Medici. 

Origem: Florença. 

Contribuições:

• Mecenas das artes no Renascimento;
• Excomungou Martinho Lutero e agravou a crise da Reforma. 

Legado: Figura cultural proeminente, mas politicamente desastrosa para a Igreja.

11. Leão XI (1605)

Nome de baptismo: Alessandro Ottaviano de’ Medici. 

Origem: Florença. 

Notas: Morreu após 26 dias de pontificado. Sem impacto.

12. Leão XII (1823–1829)

Nome de baptismo: Annibale della Genga. 

Origem: Genga, Estados Papais. 

Contribuições: Conservador, reforçou a disciplina eclesiástica e combateu a maçonaria.

13. Leão XIII (1878–1903)

Nome de baptismo: Vincenzo Pecci. 

Origem: Carpineto Romano. 

Contribuições:

• Publicou a Rerum Novarum, base da Doutrina Social da Igreja;
• Dialogou com a modernidade sem abdicar da tradição. 

Legado: Chamado “Papa dos Trabalhadores”, grande reformador social.

14. Leão XIV (2025–presente)

Nome de baptismo: Robert Francis Prevost

Origem: Natural de Chicago, EUA (informação confirmada após actualizações biográficas). 

Contexto: Igreja em declínio na Europa, mas crescendo no Sul Global. O mundo atravessa polarizações culturais e crises ecológicas.

Desafios:

• Descentralização da autoridade papal;
• Aprofundar o diálogo com África, Ásia e América Latina;
• Modernização da Cúria e combate aos abusos. 

Legado: Ainda por construir. A escolha do nome indica intenção de retomar a força dos papas reformistas e dialogantes, como Leão XIII ou o estratega Leão I.

Considerações: O Leão que não ruge desde África

Apesar de África ter sido berço de teólogos como Santo Agostinho e São Cipriano, e de possuir uma das comunidades católicas mais vibrantes do presente, o Vaticano continua sem eleger um Papa africano. A promessa de um Papa negro, ainda que repetida, permanece adiada — talvez por receios estruturais, talvez por preconceito velado.

Os “Leões” do papado demonstram que o nome carrega um peso simbólico: liderança, resistência, reforma. A história mostra que, em tempos de crise, o nome Leão tem sido escolhido por papas que se veem como restauradores da ordem e da autoridade moral.

Agora, com Leão XIV, o mundo aguarda para ver se ele será apenas mais um na longa fila ou se terá coragem de rugir por justiça, equidade e inclusão — inclusive para África.

Outro lado dos murmúrios

Apesar das especulações que frustraram as expectativas e aliviaram o medo de uma direcção negra no pontífice, em termos de antiguidade e experiência no Vaticano, um desses 3 negros deveria ser o Papa. Um argumento pan-africanista que trás consensos entre os africanos e afro descendantes, dos esperados eram: 

- Cardeal Peter Turkson, do Gana;

- Cardeal Robert Sarah, da Guiné;

- Cardeal Arinze, da  Nigéria.

Infeliz e aparentemente, tudo ignorado e para a surpresa, menos aos The Simpsons, os votos foram para o cardeal Robert Francis Prevost, que não estava nem no top 5, ainda feito Papa. Lembra um pouco do cenário para a indicação do DFC à presidência de Moçambique na Frelimo.